Conto publicado no Interpoética: http://www.interpoetica.com/site/index.php?option=com_content&view=article&id=1480&catid=129
Silêncio e sons
À amiga Conceição Santos
Ouvindo “Outro Quilombo”, de Mônica Salmaso
Ao amanhecer, ia novamente à praia para brincar com a sua solidão e a escrever palavras fragmentadas nas areias para que as ondas levassem os seus mais íntimos desejos. Saía novamente girando pela praia a escrever poemas nas areias com apenas um pedaço de madeira. Lembrava-se de sua mãe quando ela declamava poemas de Casimiro de Abreu ou quando lia “Capitães da Areia”. Sua nostalgia era silenciosa. Aí chorava e sentia a água salgada em sua boca. Era o próprio mar, tinha a alma de um oceano. Passados esses momentos de solidão, voltava-se a vida normal de sempre. Só que a música estava a todo tempo em sua vida. Tentava de alguma forma encontrar a música que fizesse sintonia com a da sua história e só a encontrava, pelo menos momentaneamente, no momento em que voltava a sua infância e lembrava-se de sua mãe. Só que nem mesmo o seu imenso amor pela mãe era necessário para sintonizar a música perfeita: faltava o desprendimento e o acreditar no depois de.
Próximo à sua casa havia uma ferrovia antiga. Brincava que cruzava as trilhas e ia pra outros lugares, talvez ao mais puro recôndito de sua alma. Ela continuava escrava das suas lembranças e pensava musicalmente: “Dor, reluz em mim fazendo sol lá no meu silêncio”. E ficava esperando o trem que nunca chegara. Somente o silêncio se fazia presente. Foi novamente à praia, seu refúgio. Sentia o calor do sol penetrando por sua pele e ficou de joelhos a louvar aquele imenso mar que estava diante de sua vista. E escreveu na areia uma mensagem. Só tinha nesse momento de agora a escrita, que estava a seu favor: a palavra era a sua memória mais permanente. Ela escreveu na areia: “Faço-me silêncio e espero o som do teu amor”. As ondas vieram e como sempre levaram o seu pedido. Todo o cosmo se fez silêncio nesse instante. De repente fez-se chuva. Não acreditava no que estava acontecendo. Chorou muito e seu choro misturou-se com a chuva. Os pingos caíam em harmonia tocando a música de sua vida e bailando em sintonia com as lembranças que margeavam a sua alma. Era chuva com sol. Era quente. Era o amor que falava. Era o “sim”. Foi acolhida: concebida de silencio e sons e batizada pelo (a)mar.
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